O uso intensivo de smartphones entre adolescentes tem vindo a levantar preocupações significativas a nível global. No contexto português, a recente recomendação do Ministério da Educação, Ciência e Inovação (MECI) para
restringir o uso de telemóveis nas escolas do 1.º e 2.º ciclos abriu espaço para novas reflexões.
Um estudo inovador, realizado por investigadoras do Ispa – Instituto Universitário de Ciências Psicológicas, Sociais e da Vida e do Agrupamento de Escolas de São Gonçalo, apresentado no II CIRPIE, Colóquio Internacional de Reflexão sobre Práticas Integradas em Educação traz agora evidência científica sobre os efeitos desta medida no bem-
estar e nas competências socio emocionais dos jovens.
O estudo, da autoria de Ivone Patrão, Giovanna Pires Giannetti, Maria João Gouveia (Ispa) e Telma Anacleto (AE São Gonçalo), focou-se na relação entre o bem-estar, a dependência do smartphone, o autocontrolo e a empatia em adolescentes, no contexto da restrição de uso do telemóvel em meio escolar. A investigação analisou ainda as perceções de alunos, pais e professores sobre os impactos dessa medida no quotidiano educativo.
Com uma amostra de 875 jovens integrados numa escola com restrição do uso do telemóvel, os dados quantitativos revelaram que:
Jovens com maior dependência do telemóvel apresentam baixo autocontrolo
e níveis mais baixos de bem-estar, apesar de demonstrarem níveis médios de
empatia;
Por outro lado, os adolescentes com maior autocontrolo e empatia evidenciam
níveis mais elevados de bem-estar, sendo estes fatores associados a
comportamentos pró-sociais e a um maior equilíbrio emocional.
A componente qualitativa da investigação, que envolveu 448 participantes da
comunidade educativa (pais/encarregados de educação, professores e alunos),
permitiu identificar vantagens e desvantagens percebidas da medida de restrição:
Vantagens percebidas:
Maior socialização entre os alunos (47%);
Maior envolvimento em atividades ao ar livre (30%);
Redução do tempo de exposição a ecrãs (23%).
Desvantagens apontadas:
Aumento de comportamentos agressivos (41%);
Dificuldades de comunicação entre os alunos (38%);
Menor possibilidade de realizar pesquisas e atividades escolares com o
telemóvel (21%).
Segundo a investigadora do Ispa, Ivone Patrão, “estes dados são fundamentais para
perceber a importância do treino de competências socio emocionais, como a empatia e
o autocontrolo, que permitem aos adolescentes gerir os conflitos e integrar-se de
forma mais saudável no grupo de pares”.
Apesar de algumas dificuldades iniciais, a socialização ser identificada como uma
vantagem demonstra que existe abertura e motivação para o contacto interpessoal
direto, o que representa uma oportunidade pedagógica para desenvolvimento de
competências relacionais.
Um dado particularmente relevante: 74,6% dos participantes (alunos, pais e
professores) concordam com a manutenção da medida de restrição do uso de
telemóveis na escola para o novo ano letivo.
Entre os que expressam discordância, destacam-se alguns pais, que referem a
necessidade de manter contacto com os filhos durante o horário escolar como
motivo principal.
A investigadora Ivone Patrão reforça que “medidas de regulação externa, como esta,
devem ser acompanhadas de uma avaliação contínua da sua eficácia, para garantir
que promovem o bem-estar dos alunos e uma relação saudável com a tecnologia”. A
questão do uso pedagógico da tecnologia em sala de aula também foi levantada,
apontando para a necessidade de um debate alargado sobre como e quando integrar
o digital no contexto educativo.
Foto – DECO Proteste